Notas de transcrição: * a grafia do século XVI era totalmente livre; portanto, nenhum esforço foi feito para harmonizar acentos, grafia etc. * nesta versão em codificação ISO-8859-1 (Latin-1), todos os caracteres acentuados não existentes neste padrão foram colocados entre parênteses rectos * O caracter ^ é usado para denotar texto em superescrito (acima da linha) TRACTADO DATERRA do Brasil no qual Se cõtem a informaçaõ das cousas que ha nestas partes feito por P^o de magalha[~e]s. Ao muy alto e Serenìssimo Principe dom Anrrique Cardeal Iffante de portugal. Posto que os dias passados apresentei outro s[~u]mario da terra do brasil a elRei nosso snõr, foi por comprir primeiro com esta obrigação de vassallo que todos deuemos anosso Rei: e por esta razáo me pareçeo cousa mui necessaria, (muýto Alto e serenissimo snõr) offereçer tambem este a V. A. aqu[~e] se deuem Refirir os louuores e acreçentamento das terras [~q] nestes Reinos floreçem: pois sempre deseiou tanto augmentallas e conseruar seus subditos e vassallos [~e] perpetua paz. Como eu isto entenda, e conheça quam aççeitos saõ os bõs seruiços a V. A. que ao Reino se fazem imaginei comigo que podia trazer destas partes com que desse testemunho de minha pura tençaõ: e acheý que naõ se podia d[~u] fraco hom[~e] esperar maior seruiço (ainda que tal naõ pareça) que lançar maõ desta informaçaõ da terra do Brasil (cousa [~q] ategora naõ imprendeo pessoa alg[~u]a) pera [~q] nestes Reinos se deuulge sua fertillidade e prouoque amuitas pessoas pobres que se vaõ viuer aesta prouinçia, que nisso consiste a felliçidade e augmento della. E porque V. A. sabe quanto seruiço de Deos e delRei nosso Snõr seýa esta denunçiaçaõ determineý collegilla com deliberaçaõ de a offereçer a V. A. aqu[~e] humilmente peço ma Reçeba, e com tamanha merçe ficarei satisfeito Rogando a nosso Sñor lhe de prosperos e largissimos annos de vida e deixe permaneçer Seu Real estado emperpetua filliçidade. am[~e]. Humilde vassallo de V. A. Pero de magalhães Prollogo Ao lector. Minha tençaõ naõ foi outra neste summario (discreto e corioso lector) senaõ de nunçiar em breues pallauras a fertillidade e abundançia da terra do brasil, pera que esta fama venha a notiçia de muitas pessoas que nestes Reinos viuem com pobreza, e naõ duuidem escolhelha pera seu Remedio: por[~q] a mesma terra he tam natural e fauorauel aos estranhos que a todos agazalha e conuida com Remedio por pobres e desemparados que seiaõ. Eassy cada vez se vay fazendo mais prospera, e depois [~q] as terras viçosas se forem pouoando (que agora estaõ desertas por falta de gente) haõ se de fazer nellas grossas fazendas como ia estaõ feitas nas [~q] possuem os moradores da terra, etambem se espera desta prouinçia que por tempo floreça tanto na Requeza como as Antilhas de Castella por que he çerto ser en si aterra mui riqua e auer nella m^{tos} metais, osquais ategora se naõ descobr[~e] ou pornaõ auer gente na terra pera cometer esta impreza, outambem por negligençia dos moradores que se naõ querem despor aesse trabalho: qual seja a causa por que o deixaõ de fazer naõ sei. Mas permittira nosso snõr que ainda em nossos dias se descubrã nella grãdes thezouros, assy pera seruiço e augm[~e]to de S. A. como pera porueito de seus vassallos que o deseião seruir. Declaracão da costa. Esta costa do brasil está pera a parte do occidente, corre se de norte e sul. Da primeira pouoaçaõ a tederradeira ha trez[~e]tas e sincoenta legoas. Saõ oito capitanias todas tem portos mui seguros onde pod[~e] entrar quais quer naos por grandes que seiaõ. Naõ ha pella terra dentro pouoações de portugeses por causa dos indios que naõ no consente, etambem pello soccorro e tractos do Reino lhes he neçessario estarem iunto domar pera ter[~e] comunicação de mercadorias. E por este Respeito viu[~e] todos junto da Costa. Cap. 1.^o da capitania de Tamaracá. A pouoaçaõ da primeira capitania e mais antiga está nuã ilha que se chama Tamaracá pegada com aterra firme, tem tres legoas de comprido e duas de largo: t[~e] trinta e sinco legoas de terra pella costa pera o norte. He de dona Jeronima dalBuquerque molher que foi de Pero Lopez de Sousa naqual tem posto Capitaõ de sua maõ. ha nella h[~u] engenho dassucre, e agora se faz[~e] dous nouam[~e]te, e muito pao do brasil e algodaõ. Pode ter ate ç[~e] vezinhos. Ha nesta capitania muitas e boas terras pera se pouoarem e fazerem nellas fazendas. Cap. 2.^o da capitania de Phernãbuco. [Nota lateral: Noua Lusitania a chamã muytos pollas frequ[~e]cia, é policia] [Nota lateral: agora som .60. anno de 1587.] A capitania de Phernambuco está sinco legoas de Tamaracá pera o sul em altura de oito graos, daqual he capitaõ e gouernador Duarte coelho dalBuquerque. Tem duas pouoações, a prinçipal se chama Olinda, a outra Guarassú que esta quatro legoas pella terra dentro. Auera nesta capitania mil vezinhos. Tem =vinte etres= engenhos dassucre, posto que tres ou quatro delles naõ saõ ainda acabados. [Nota lateral: agora quatro mil [~q] sam todas as arrouas [~q] se librã aqui, 240. M.] Alg[~u]s moem com bois aestes chamã tripiches, fazem menos assucre que os outros. mas amaior parte dos engenhos do brasil mo[~e] com agoa. Cada engenho destes h[~u] poroutro, faz =trez= mil arrobas cadano. nesta capitania se fazem mais assucres que nas outras, porque ouue anno que passaraõ de sincoenta mil arrobas, ainda que o Rendimento delles naõ he çerto, saõ segundo asnouidades e os tempos que se offereç[~e]. Esta seacha huã das Ricas terras do brasil, tem muitos escrauos indios [~q] he aprinçipal fazenda daterra. Daqui os leuaõ e compram pera todellas outras capitanias, porque ha nesta muitos, emais baratos que entoda costa. ha muitos pao do brasil e algodaõ de que enrriqueç[~e] os moradores desta capitania. [Nota lateral: a este porto se entra por un canal tam estreyto, [~q] apenas cabe una náo por elle y sino entra cõ muyto t[~e]to, da en pedra viua y perdesse ô qual acõtece muytas vezes aos exprim[~e]tados: por isso se chama Paranambuc. [~q] quer dix Mar furado] O porto onde os nauios entraõ está h[~u]a legoa da pouoaçaõ Olinda seruense pella praya e tambem por h[~u] Rio pequeno que vai dar junto da mesma pouoaçaõ. Aesta capitania vaõ cadanno mais nauios do Reino que anenhuã das outras. Hanella h[~u] mosteiro de padres da companhia de Jesus. Rios. Ha dous Rios caudais ate a Bahia de todollos sanctos. h[~u] se chama de saõ francisco, está em dez graos e meyo, oqual entra nomar contanta furia [~q] vinte legoas pello mesmo mar correm suas agoas outro Rio está em onze graos e dous terços que se chama o Rio Real, tambem he muigrande e correm muito suas agoas pello mar. Cap. 3. da capitania da Bahya de Todollos Sanctos. A Capitania da Bahia de todollos sanctos esta çem legoas de phernãbuco emaltura de treze graos. terra del Rei nosso snõr onde Residem os gouernadores e bispo e ouuidor geral de toda costa. esta he a terra mais pouoada de portugueses que ha nobrasil. Tem tres pouoaço[~e]s, a prinçipal he a cidade do saluador. Aoutra se chama Villa Velha que esta junto da barra, Esta pouoaçaõ foi aprimeira que ouue nesta capitania: de pois Thome de Sousa Sendo gouernador edificou esta cidade do saluador mais adiãte meýa legoa ao longo da Bahia por ser lugar mais comueniente e porueitoso pera osmoradores da terra. Quatro legoas pella terra dentro está outra[~q] se chama Paripé. pode auer nesta capitania mil e çem vezinhos. Tem dez oito engenhos, alg[~u]s sefazem nouam[~e]te: tambem se tira delles muito assucre, ainda que osmoradores se lançã mais aoalgodaõ que a canas dassucres porque se daa milhor naterra. Dentro da çidade está h[~u] mosteiro de padres da companhia de Jesus, noqual tem colegio onde ensinã latim e casos de consçiençia. Afora este ha sinco igreias pella terra dentro antre os indios forros onde Resid[~e] alg[~u]s padres pera fazer[~e] christaõs e casarem osmesmos indios por naõ estar[~e] amãçebados. Esta capitania tem huã bahya mui grande e fermosa, he tres legoas de largo e nauegase quinze porella dentro. t[~e] muitas ilhas de terras mui viçosas quedaõ infinito algodaõ, diuidese em muitas partes esta bahia: etem muitos braços e enseadas dentro. Os moradores da terra todos se seruem porella cõ barcos pera suas fazendas. Rios. Doze legoas desta bahia de todollos sanctos esta h[~u] Rio que se chama Tinharée onde se Recolhem muitas embarcações [~q] passã, pera as outras capitanias. Tres legoas por elle dentro está h[~u] engenho dum Bastiã de ponte, junto doqual estaõ muitas terras perdidas por falta de moradores, dasquais se consegiria muito porueito se as pouoassem. Mais auante seis legoas esta h[~u] Rio que se chama Camamù em treze graos e dous terços, no qual pod[~e] entrar quais quer naos seguramente. quatro sinco legoas porelle dentro. Ao longo deste Rio ha terras mui viçosas e muitas agoas pera se poder[~e] fazer engenhos dassucre, as quais tambem se perdem por naõ auer gente que as va pouoar. Tem dentro alguãs ilhas de terras mui grossas e acomodadas pera se fazerem nellas muita fazenda. Neste mesmo Rio ha muito peixe em estremo, e junto delle muita infinita caça de porcos e veados. Aqui se pode fazer huã pouoação onde os hom[~e]s viuaõ mui abastados e façaõ muitas fazendas. Ha outro que se chama o Rio das contas, está em quatorze graos e meyo, mas naõ he tangrande, ainda [~q] tambem entrão nelle alguãs embarcações. Entodos estes Rios ha muita abundançia de peixes e de Caça. Cap. 4^.o da capitania dos Ilheos. A Capitania dos Ilheos está trinta legoas da Bahia de todollas sanctos em quatorze graos e dous terços. he de francisco giraldez na qual tem posto capitaõ de sua maõ. Pode auer nella dozentos vezinhos. Tem h[~u] Rio onde os nauios entraõ oqual está junto da pouoaçaõ. diuidesse emmuitas partes pella terradentro, seru[~e]se os moradores porelhe pera suas fazendas em almadias. ha nesta capitania oito engenhos dassucre. dentro da pouoação está h[~u] mosteiro de Padres da companhia de Jesus [~q] agora se faz nouamente. Sete legoas da mesma pouoaçaõ pella terra dentro está huã lagoa dagoa doçe [~q] tem tres legoas de comprido e tresde largo etem dez quinze braças de fundo e dahi pera sima. Sae della h[~u] Rio pequeno pello qual vaõ la ter barcos. t[~e] esta lagoa h[~u] bocal neste Rio tam estreito, que apenas cabe h[~u] barco por elle, e depois que anda dentro quasi naõ sabe determinar por onde entrou. Ten, tanta abundançia dagoa que podem andar nella quais quer naos por grãdes que seiaõ a vella: e assy quando v[~e]ta muito, alleuantam se alli ondas tam foriosas como se fosse no meyo do mar comtormenta. Tem muita infinidade de peixes grandes e pequenos. Criamse nella muitos Peixes bois os quais tem o foçinho como de boi e dous cotos com que nadaõ amaneira de braços, naõ tem nenhuã escama n[~e] outra feiçaõ de peixe se naõ o Rabo. Matamnos com arpo[~e]s, saõ tam gordos e tamanhos [~q] alg[~u]s pezaõ trinta corenta arrobas. he h[~u] peixe muito sabroso e totalmente pareçe carne e assy tem o gosto della, assado pareçe lombo de porco ou de veado, cozese com couves e guizase como carne, n[~e] pessoa alguã o come que o tenha por peixe saluo se o conheçer primeiro. As femeas tem duas mamas pellas quais mamão os filhos e criamse com leite (cousa [~q] se naõ acha noutro peixe alg[~u]) tambem ha destes emalguãs bahias e Rios desta costa, e posto que se cri[~e] no mar, custumã beber agoa doçe porisso acodem muitos aesta lagoa, ou a parte onde alg[~u] Ribeiro se meta no mar. Tambem ha muitos tubaro[~e]s nesta lagoa, e lagartos e muitas cobras, E achamse nella outros mõstros marinhos de diuersas maneiras. Ha muitas terras e mui viçosas orredor della, e muita caça, E neste rio que sae da lagoa muita fertilidade de peixe. Finalmente que huã das abastadas terres de mantimentos [~q] que ha no Brasil he esta capitania dos ilheos. Cap. 5.^o duã nascaõ de gentio [~q] se acha nesta Capitania. Pellas terras desta capitania ate junto do Spiro sancto, se acha h[~u]a çerta nasçaõ de gentio que veo do çertaõ ha sinco ou seis annos, e dizem [~q] outros indios contrarios destes, vierão sobrelles a suas terras, e os destruiraõ todos e os que fogiraõ saõ estes [~q] andaõ pella costa. chamãse Aýmores, a lingoa delles he differente dos outros indios, ning[~e] os entende, saõ delles tam altos e taõ largos do corpo [~q] quasi pareç[~e] gigantes. Saõ mui aluos naõ tem pareçer dos outros indios da terra n[~e] tem casas n[~e] pouoaço[~e]s onde mor[~e], viu[~e] antre os matos como brutos animais: saõ mui forçosos em estremo, trazem h[~u]s arcos mui compridos e grossos conforme a suas forças e as frechas da mesma maneira. Estes indios tem feito muito dano aos moradores de pois que vieraõ aesta costa e mortos alg[~u]s portugeses e escrauos por[~q] saõ imigos de toda gente. Naõ pelleyaõ em campo n[~e] tem animo pera isso, po[~e] se antre omato junto dalg[~u] caminho e tanto [~q] passa algem attiraõlhe ao coraçaõ ou aparte onde o matem e naõ despedem frecha que naõ na empregem. finalmente que naõ tem Rosto direito aning[~e] senaõ a treiçaõ fazem a sua. As molheres trazem h[~u]s paos tostados comque pelleiaõ. Estes indios naõ viuem senaõ pella frecha, seu mantim[~e]to he caça bichos e carne humana fazem fogo de baixo do chaõ pornaõ ser[~e] sentidos n[~e] saberem onde andaõ. Muitas terras viçosas estaõ perdidas junto desta capitania, as quais naõ saõ possuidas dos Portugeses por causa destes indios. Naõ se pode achar Remedio pera os destruirem por[~q] naõ tem morada certa, nem saem nunca dantre o matto: E assi quando cuidamos [~q] vaõ fogindo ante qu[~e] os persege entaõ ficam atraz escondidos e atiraõ aos que passaõ descuidados, Desta maneira mataõ alguã gente. todos quantos indios ha no brasil saõ seus imigos e tem[~e]nos muito porque he gente atreiçoada. E assy onde os ha nenh[~u] morador vai a sua fazenda por terra [~q] naõ leue quinze vinte escrauos consigo de arcos e frechas. Estes Aymores são mui feros e crueis, naõ se pode cõ pallauras encareçer a dureza desta g[~e]te. Naõ andaõ todos juntos, derramamse por muitas partes, equando sequerem ajuntar assubiã como passaros ou como bogios demaneira que h[~u]s aos outros se entendem e se conheç[~e]. Tambem os portugeses mataõ alg[~u]s delles, e tem muitos destruidos, principalmente nesta capitania dos ilheos, eguardaõse muito delles por que ja sabem suas manhas e conheç[~e] muibem sua mallicia. Cap. 6. da Capitania de Porto seguro. A capitania de Porto seguro está trinta legoas dos jlheos em dezaseis graos e meýo. He do Duque daueiro, na qual tem posto capitaõ de sua maõ. Tem tres pouoaço[~e]s a prinçipal he porto seguro que está junto do porto onde os nauios entraõ. outra está dahi huã legoa [~q] se chama sancto amaro outra Sancta Cruz que está dahi quatro legoas pera o norte. pode auer nesta capitania dozentos e vinte vezinhos. Tem sinco engenhos dassucre. Ha nella h[~u] mosteiro de padres da companhia de Jesus. Tambem chegaõ aesta capitania os Aymorés e fazem nella dano aos moradores como nos ilheos. he terra mui abastada de caça, e de peixes que mataõ no Rio que está junto da pouoacaõ. Cap. 7.^o da Capitania do spirito sancto. A Capitania do spirito sancto está sinco[~e]ta, legoasde Porto seguro em vinte graos, da qual he capitaõ e gouernador Vasco fernandes coutinho. Tem h[~u] engenho somente, tira se delle omilhor assucre [~q] ha entodo Brasil. Ha nella muito algodaõ e pao do brasil. Pode ter ate cento e oitenta vezinhos, Ha dentro da pouoaçaõ h[~u] mosteiro de padres da Companhia de Jesus. Tem h[~u] Rio muj grande onde os nauios entraõ, noqual se achaõ mais peixes bois que noutro nenh[~u] Rio desta Costa. No mar junto desta Capitania mataõ grande copia de peixes grandes E de toda maneira, e tambem nomesmo Rio ha muita abundançia delles. Nesta capitania ha muitas terras e muj largas onde os moradores viu[~e] mui abastados assi de mantim[~e]tos da terra como de fazendas. E quando se tomou a fortalleza do Rio de Janeiro desta mesma capitania do Spirito Sancto sostentaraõ toda gente e proueraõ sempre de mãtim[~e]tos neçessarios enquanto esteueraõ na terra os que a defendiaõ. Rios. Auante desta capitania em altura de vinte e h[~u] graos está o Rio de paraiba este he mui grande e fermoso e tem infinito peixe. Junto do cabo frio [~e] altura de vinte e dous graos está a Bahia fermosa naqual se pode fazer h[~u]a capitania de muitos vezinhos onde tambem se perdem muitas terras por falta de gente. Outros muitos Rios ha nestas partes [~q] deixo descreuer por serem pequenos e naõ se fazer tanto caso delles, n[~e] minha tençaõ foi outra senaõ tractar destes mais notaueis onde se podem fazer alguãs pouoaço[~e]s e cõsegir porueito das terras viçosas que poresta costa estaõ desertas. Cap. 8.^o da Capitania do Rio de Janeiro. A Capitania do Rio de Janeiro cidade de sam Sebastiaõ está sesenta legoas do Spirito Sancto em vinte e tres graos e h[~u] terço, terra delRei nosso snõr. Pode ter pouco mais ou menos cento e corenta vezinhos, agora se começa de pouoar nouamente. Esta he amais fertil e viçosa terra que ha no brasil. Tem terras mui singullares e muitas agoas pera engenhos dassucre. Ha nella muito infinito pao do brasil de que os moradores da terra faz[~e] muito porueito. Esta capitania tem h[~u] Rio mui largo e fermoso diuide se dentro emmuitas partes, e quantas terras estaõ ao longo delle se podem aporueitar, assy pera Roças de mantimentos como pera canas dassucres e algodo[~e]s, porque saõ muj viçosas e milhores de quantas ha por toda esta costa. ha nesta çidade h[~u] mosteiro de padres da companhia de Jesus, os quais tambem augmentaraõ muito esta terra e deseiaõ muito vella pouoada de muitos moradores, por[~q] saõ tomo digo as terras desta capitania mui largas e sabem quam porueitosas saõ pera toda gente pobre que as for possuir. E por tempo haõ se de fazer nellas grãdes fazendas: eosque la forem viuer com esta esperança naõ se acharão enganados. Cap. 9.^o da Capitania de SanViçente. A Capitania de sanviçente está sesenta legoas do Rio de Janeiro em Vinte equatro graos, he de pero lopez de sousa, naqual tem posto capitaõ de sua maõ: esta e o Rio de Janeiro saõ as mais frias terras que ha no Brasil, gea nellas em tempo de inuerno quasi como neste Reino. Nesta capitania se deu ja trigo, mas naõ no quer[~e] semear por auer na terra outros mantim[~e]tos de menos custo. Tem tres pouoações, e huã fortalleza [~q] está nuã ilha junto da terra firme quatro legoas pera onorte que se chama Britioga, daqui deffendem esta capitania dos indios e françeses com artelharia que ha na mesma fortalleza. Aprinçipal pouoaçaõ se chama sanctos onde está h[~u] mosteiro de padres da companhia de Jesus. Aoutra mais avãte ao longo do Rio huã legoa he Sam Viçente, tambem ha nella outro mostr.^o de padres da companhia. Pella terra d[~e]tro dez legoas edificarão os mesmos padres huã pouoação antre os indios que se chama o Campo naqual Viuem muitos moradores, amayor parte delles são mamalucos filhos de portugueses e de indias da terra. Aqui e nas mais Capitanias tem feito estes padres da companhia grande fruito e fazem com que a terra va em muito creçim[~e]to, trabalhaõ por fazer christaõs a muitos indios, e metem muitas pazes antre os hom[~e]s, tãbem faz[~e] Restituir as liberdades de muitos indios que alg[~u]s moradores da terra tem mal Resgatados: assy que sempre acodem aos que se desuiaõ do seruiço de Deos e de S. A. Auera nesta capitania quinhentos vezinhos, tem quatro engenhos dassucre, E muitas terras viçosas de que os moradores tiraõ muitos mantim[~e]tos e fazenda e viu[~e] todos mui abastados. Estahe a ultima Capitania [~q] ha nestas partes do Brasil. Tractado segundo das cousas que são gerais por toda Costa do Brasil Cap. 1.^o das fazendas da terra Os moradores desta costa do Brasil todos tem terras de sesmaria dadas e Repartidas pellos capita[~e]s da terra, e a primeira cousa que pretendem alcansar, saõ escrauos pera lhes fazer[~e] e grangear[~e] suas Roças e faz[~e]das por que sem elles não se pode[~e] sustentar na terra: E huã das cousas por[~q] o Brasil naõ floreçe muito mais, he pellos escrauos que se alleuantaraõ e fogiraõ pera suas terras, e fogem cada dia: E se estes indios naõ foraõ tam fogitiuos e mudaueis, não teuera comparaçaõ a Riqueza do Brasil. As fazendas donde se consige mais porueito saõ assucres, algodo[~e]s e pao do brasil, cõ isto fazem pagamento aos mercadores que deste Reino lhes leuão fazenda porque o dinheiro he pouco na terra, e assy vend[~e] e trocã h[~u]a mercadoria por outra em seu justo preço. Quantos moradores ha na terra tem Roças de mantim[~e]tos, e v[~e]d[~e] muitas farinhas de pao h[~u]s aos outros, de que tambem tiraõ muito porueito. O mais gado que ha nesta costa saõ bois e vacas, deste ha muita abundançia [~e] todallas capitanias, porque saõ as heruas muitas e sempre a terra esta cuberta de verdura, ainda que em porto seguro naõ sequer[~e] dar nenh[~u]as vacas senão o primeiro anno, no qual engordaõ tanto que do muito viço dizem que morr[~e] todas. Cabras e ouelhas ha muito poucas ategora, começaõ de multiplicar nouamente; as cabras se daõ melhor que as ouelhas E parem dous tres filhos de cadauez. fazem os moradores da terra muito por esta criação. Tambem ha egoas e cauallos, mas ainda saõ caros por naõ auer muitos na terra, leuaõ nos do cabo verde pera la edaõ se muito bem na terra. Achase tambem por esta costa muito Amber que omar de sy lança fora as mais das vezes quando faz tormenta e saõ agoas viuas, entaõ ha muitas pessoas que mãdã seus escrauos pella praya buscallo nos lugares onde custuma sair mais vezes, e muitas vezes aconteçe enriqueçer[~e] alg[~u]s assy do que achaõ seus escrauos como do que Resgataõ aos indios forros. Seg[~u]do a dita e ventura de cada h[~u]. Os panos que nesta terra se faz[~e] são dalgodaõ, todo mais vay deste Reino. E assy ha tambem muitos escrauos de guine: estes saõ mais seguros [~q] os indios da terra por que nunca fog[~e] n[~e] tem pera onde. Ha tambem muita criaçaõ de porcos e muitas galinhas adens e patos da terra. Estas saõ as fazendas [~q] possu[~e] os moradores do brasil. Cap. 2.^o dos custumes da terra As pessoas que no brasil querem viuer tanto que se fazem moradores da terra por pobres que seiaõ se cada h[~u] alcançar dous pares ou meyaduzia descrauos ([~q] pode h[~u] por outro custar pouco mais ou menos ate dez cruzados) logo tem Remedio pera sua sostentação por[~q] h[~u]s lhe pescam e caçaõ outros lhe fazem mantimentos e fazenda e assy pouco a pouco enRiqueç[~e] os hom[~e]s e viuem honrradam[~e]te na terra com mais descanso [~q] neste Reino, por[~q] os mesmos escrauos indios da terra buscam de comer pera si e pera os senor[~e]s, e desta maneira naõ fazem os hom[~e]s despeza com seus escrauos em mãtimentos n[~e] com suas pessoas. A maior parte das camas do Brasil saõ Redes, as quais armaõ nuã casa com duas cordas e lançaõse nellas a dormir. este custume tomaraõ dos indios da terra. Os moradores destas capitanias tratamse muito bem e saõ mais largos que a gente deste Reino, assy no comer como no vestir de suas pessoas, e folgam dajudar h[~u]s aos outros com seus escrauos e fauorec[~e] muito os pobres que começãoviuer na terra. Isto se custuma nestas partes: e fazem outras muitas obras pias por onde todos tem Remedio de vida e nenh[~u] pobre anda pellas portas a pedir como neste Reino. Cap. 3.^o das callidades da terra. Ha nestas partes do Brasil seis meses de verão e seis de inuerno: os de verão são de setembro ate feuereiro, os de inuerno de março ate agosto. Assy que quando nesta prouinçia do brasil he inuerno cá nestes Reinos he verão, eos dias quasi s[~e]pre saõ tamanhos como as noites, huã ora som[~e]te creç[~e] emingoão. Cursaõ sempre ventos gerais, no inuerno seis meses sul é sueste no verão nordeste. Sempre correm as agoas com o vento por costa, E por isso senaõ pode nauegar de h[~u]as capitanias pera outras se naõ esperar[~e] por mouções pera irem com as agoas e com o vento, porque cursaõ como digo seis meses duã parte e seis doutra e portanto saõ muitas veses as viagens vagarosas e quando vão contra tempo as embarcaço[~e]s corr[~e] muito Risco e arribaõ as mais das vezes ao porto donde sairaõ. Mete se no meyo e na força deste verão oito dias ante os Sanctos huã tormenta de vento sul que dura huã sommana, este he mui çerto e geral, n[~u]ca se acha, que naquelles dias faltasse. Muitas embarcações esperão por este vento e fazem com elle suas viagens. Esta terra sempre he quente quasi tãto no inuerno como no verão. A viraçaõ do vento geral entra ao meyo dia, pouco mais oumenos, he tam fresco este v[~e]to e tam frio [~q] naõ se sente mais calma, e ficam Recreados os corpos das pessoas. Dura este vento do mar a te de madrugada, torna dalli acalmar outra vez por causa dos vapores da terra [~q] o apagam e quãdo amanheçe está o ceo todo cuberto de nuuens e as mais das manhãs choue nestas partes e a terra fica toda cuberta de neuoa por que tem muitos aruoredos e chama a sy todos estes humores. Etanto [~q] este geral acalma começa a ventar da terra h[~u] vento brando que nella se gera, a te que o sol con sua quentura o torna apagar e alimpa tudo outra vez e faz ficar odia claro e sereno, entrão logo [~e]tra o vento do mar acustumado. Este vento da terra he mui perigoso edoentio e se açerta de permaneçer alg[~u]s dias morre muita gente assy portugeses como indios da terra, mas quer nosso snõr que acõteça isto poucas vezes, e tirado este mal he esta terra mui sallutifera e de bõs ares onde as pessoas se achaõ bem despostas e viuem muitos annos prinçipalmente os velhos tem milhor despossiçaõ e pareç[~e] que tormã a Renouar e porisso alg[~u]s se naõ quer[~e] tornar a suas patrias temendo que nellas se lhes offereça amorte mais çedo. os ares de pella manhaã saõ mui frescos e sadios: muitas pessoas se custumaõ alleuãotar çedo por que se aporueitem delles enquanto tem esta vertude. A terra em si he lassa e deleixada achãose nella os hom[~e]s alg[~u] tanto fracos e mingoados das forças que possuem cá neste Reino por Respeito da quentura e dos mantimentos que nella vsaõ, isto he enquanto as pessoas saõ nouas na terra, mas de pois [~q] por tempo se acustumão ficão tam Rijos e bem despostos como se aquella terra fora sua mesma patria. Manda se dar nesta terra aos infermos carne de porco, pera qual quer doença he porueitosa e naõ faz mal a nenhuã pessoa: o peixe tãbem tem a mesma callidade e poem muita sustançia aos doentes. Esta terra he mui fertil e viçosa, toda cuberta de altissimos e frondosos aruoredos permaneçe sempre a verdura nella inuerno e veraõ, isto causa chouerlhe muitas vezes e naõ auer frio que offenda ao que produz a terra. Ha por baixo destes aruoredos grande mato e muj basto e detalmaneira está escuro e serrado em partes que nunca parteçipa o chaõ da qu[~e]tura n[~e] da claridade do sol, e assy está sempre humido e manãdo agoa de sý. As agoas que na terra se bebem saõ mui sadias e sabrosas, por muita [~q] se beba naõ prejudica a saude da pessoa, a mais della se torna logo a suar e fica o corpo desaliuádo e saõ. Finalm[~e]te que he esta terra tã delleitosa e temperada [~q] n[~u]ca nella se sente frio n[~e] quentura sobeja. Cap. 4.^o dos mantimentos da terra. Nestas partes do Brasil não semeão trigo nem se da outro mantimento alg[~u] deste Reino. o que la se come em lugar de paõ he farinha de pao: Esta se faz da Raiz duã pranta que se chama mandioca, aqual he como jnhame. E tanto que se tira de baixo da terra, está cortindo se em agoa tres quatro dias E depois de cortida pizaõ na ou Rellaõ na muito bem e espremem na da quelle sumo de talmaneira que fique bem escorrida por[~q] he aquella agoa que sae della tam pessonhenta que qualquer pessoa ou animal que a beber logo naquelle instante morre: assy que de pois de a terem deste modo curada, poem h[~u] alguidar grande sobre o fogo e como se aquenta, botaõ aquella mandioca nelle E por espaço de meya ora está naquella quentura cozendose, dally atiraõ E fica temperada pera se comer. ha todauia farinha de duas maneiras huã se chama de gerra, E outra fresca, a de gerra he muito seca, fazemna desta maneira peradurar muito e naõ sedanar: afresca he mais branda e t[~e] mais sustançia, finalmente que naõ he taõ aspera como a outra, mas naõ dura mais que dous tres dias como passada qui logo se dana. Desta mesma mandioca fazem outra maneira de mantimentos que se chamaõ beijuús, saõ mui aluos e mais grossos [~q] obreas: destes vsaõ muito os moradores da terra porque saõ mais sabrosos e demilhor desistaõ que a farinha. Outra Raiz ha duã pranta que se chama Aýpim daqual fazem h[~u]s bollos que pareçem paõ fresco deste Reino e tambem se come assada como batata, de toda maneira se acha. nella m^{to} gosto. Tambem ha naterra muito milho zaburro, este se daa em todallas capitanias E faz h[~u] paõ muito aluo. ha nesta terra muita copia de leite de vacas, muito arroz, faua feigo[~e]s muitos inhames e batatas, E outros legumes [~q] fartaõ muito a terra. Ha muita abundançia de marisco e de peixe portoda esta costa. Com estes mantimentos se sustentaõ os moradores do Brasil sem fazerem gastos nem deminuir[~e] nada em suas faz[~e]das. Cap. 5.^o da caça da terra. Huã das cousas que sostenta e abasta m^{to} os moradores desta terra do Brasil, he amuita caça que ha nestes matos de muitos generos e de diversas maneiras, aqual os mesmos indios da terra mataõ assy com frechas como por industriade seus lassos e fojos onde custumão tomar amaior parte della. Ha muitos veados e muita somma de porcos montezes de muitas castas. H[~u]s pequenos ha naterra que tem as çedas mui grossas, asperas e crespas, estes tem o embigo nas costas, matam se muitos delles, e doutros grandes que naõ saõ desta callidade. Ha muitas antas que quasi saõ tamanhas como vacas e pasçem heruas como outro gado qualquer, sua carne t[~e] o sabor como de vaca: a pelle deste animal he mui grossa e Rija. Ha tambem coelhos mas tem as orelhas doutra maneira mais pequenas e Redondas. Ha outros animais maiores que lebres que se chamaõ pacas, tambem tem carne m^{to} sabrosa. H[~u]s bichos ha nesta terra [~q] tambem se com[~e] e se tem pella milhor caça que ha nomatto. chamãolhes Tatús saõ tamanhos como coelhos E tem h[~u] casco amaneira de lagosta como de cagado, mas he Repartido em muitas juntas como laminas, pareçe totalmente h[~u] caualo armado, tem h[~u] Rabo do mesmo casco comprido, o foçinho he como de leitaõ, e naõ bota mais fora do casco [~q] a cabeça, tem as pernas baixas E criaõ se em couas a carne delles tem o sabor quasi como de gallinha. Esta caça he muito estimada na terra. ha tambem muitas gallinhas de mato que os indios mataõ cõ frechas, e outras muitas aues mui gordas e sabrosas milhores [~q] pordizes. Desta E doutra muita caça ha no brasil m^{ta} ab[~u]dançia. Cap. 6.^o das fruitas da terra. Huã fruita se da nesta terra do Brasil muito sabrosa e mais prezada de q[~u]atas ha. Cria nuã pranta, humilde iunto do chaõ, a qual tem huãs pencas como cardo, a fruita della nasçe como alcachofres e pareçem naturalmente pinhas e saõ do mesmo tamanho, chamaõ lhes Ananaszes. Ede pois de maduros tem h[~u] cheiro muito exçellente, colhemnos como saõ de vez, e cõ huã faca tiraõ lhes aquella casca grossa e fazem nos en talhadas e desta maneira, se com[~e]. exçedem no gosto aquantas fruitas ha neste Reino, e fazem todos tanto por esta fruita, [~q] mandaõ prantar Roças delles como de cardaes; aeste nosso Reino trazem m^{tos} destes ananazes em conserua. Outra fruyta se cria n[~u]as aruores grandes, estas senaõ prantaõ, nasçem pello mato muitas, esta fruita depois de madura he muito amarella, saõ como péros Repinaldos compridos, chamão lhe cajuus, tem muito sumo, e cria se na ponta desta fruita de fora h[~u] caroço como castanha, e nasçe diante da mesma fruita, oqual tem a casca mais amargosa que fel, e se tocar[~e] com ella nos beiços dura muito aquelle amargor e faz empollar toda boca, pello contrario este caroço assado, he muito mais gostoso [~q] am[~e]doa saõ de sua natureza mui quentes em estremo. ha naterra tantos destes caroços que os medem aos alqueires. Tambem ha huã fruita que lhe chamaõ bananas, e pella lingoa dos indios pacouas, ha na terra muita abundançia dellas: pareç[~e] se na feiçaõ com pepinos, nasç[~e] nuãs aruores mui tenrras enaõ saõ muito altas, n[~e] tem Ramos senaõ folhas mui comprimidas e largas. Estas bananas criamse em cachos alg[~u] se acha [~q] tem de cento e sincoenta pera cima, e muitas vezes he tam grande o pezo dellas que faz quebrar a aruore pello meyo. Como saõ de vez colhem estes cachos, e depois de colhidos amadureç[~e], etanto [~q] que estas aruores daõ huã fruita, logo as cortaõ por que naõ frutifiçaõ mais que a primeira vez, E tornaõ arrebentar pellos pees outras nouas. Esta he huã fruita mui sabrosa e das boãs que ha na terra, tem huã pelle como de figo aqual lhes lançaõ fora quando as quer[~e] comer E se com[~e] muitas dellas fazem damno a saude E causaõ febre aqu[~e] se desmãda nellas. E assadas maduras saõ muito sadias E mandaõ se dar aos infermos. Cõ esta fruita se mantem amaior parte dos escrauos desta terra, por[~q] assadas verdes passaõ por mantim[~e]to Equasi tem sustançia de paõ. Ha duas callidades desta fruita, huãs saõ pequenas como figos brojassotes as outras saõ maiores e mais compridas. Estas pequenas tem dentro em si huã cousa estranha aqual he que quando as cortaõ pello meyo com huã faca ou porqualquer parte que seja acha se nellas h[~u] signal amaneira de cruçifixo, E assy totalmente o pareçe. Tambem ha huã fruita [~q] se chama Aracases, saõ como nespras postoque comaõ muita naõ faz[~e] mal a saude. Ha muita pimenta da terra come se verde, queima muito em grande maneira. Outras muitas fruitas ha pello mato d[~e]tro de diuersas callidades, E saõ tantas que ja se acharaõ pella terra dentro alguãs pessoas e sostentaraõ se cõ ellas muitos dias sem outro mantimento alg[~u]. Estas que aqui escreuo saõ asque os portugeses tem antre sy em mais estima E asmelhores da terra. Alguãs fruitas deste Reino se daõ nestas partes-s-muitos mello[~e]s, pepinos e figos de muitas castas, Romãs m^{tas} parreiras quedaõ huuas duas tres vezes no anno E tanto que huãs se acabaõ, começaõ logo outras nouam[~e]te, E desta maneira n[~u]ca esta o brasil sem fruitas. De limo[~e]s e laranjas ha muita infinidade: daõ se muito na terra estas aruores de espinho e multiplicaõ mais que as outras. Cap. 7.^o da Condiçaõ E Custumes dos indios da terra. Naõ se pode numerar nem compr[~e]der a multidaõ do barbaro gentio que semeou a natureza por toda esta terra do brasil por que ningem pode pello sertaõ dentro caminhar seguro, n[~e] passar por terra onde naõ ache pouoações de indios armados contra todas as naço[~e]s humanas, Eassi como saõ muitos permittio Deos que fossem contrarios h[~u]s dos outros, E que ouuesse antrelles grandes odios E discordias porque se assy naõ fosse os portugeses naõ poder[~i]a viuer na terra nem seria possiuel, conquistar tamanho poder de gente, Auia muitos destes indios pella costa Junto das capitanias, tudo enfim estaua cheo delles quando começarão os Portugeses apouoalla terra, mas por[~q] os mesmos indios se alleuãotauaõ contra elles E faziaõ lhes muitas treiço[~e]s, os gouernadores E capita[~e]s da terra destruiraõ nos pouco apouco e mataraõ muitos delles, outros fogiraõ pera o sertaõ, E assy ficou a costa despouoada de gentio aolongo das capitanias. Junto dellas ficaraõ alg[~u]as aldeas destes indios que saõde paz e amigos dos portugeses. Alingoa deste gentio toda pella costa he huã: careçe de tres letras-s-naõ se acha nella f, nem L, n[~e] R, cousa digna despanto, por[~q] assy naõtem se n[~e] lei, n[~e] Rei e desta maneira viu[~e] sem Justiça e desordenadam^{te}. Estes indios andaõ n[~u]s sem cobertura alguã assi machos como femeas naõ cobr[~e] parte nenh[~u] de seu corpo e trazem descuberto quanto a natureza lhes deu. Viu[~e] todos em aldeas, pode auer em cada huã sete oito casas, asquais saõ compridas. feitas amaneira de cordoarias e cadahuã dellas está chea de gente duã parte e doutra, e cada h[~u] por sy tem sua estançia e sua Rede armada emque dorme e assy estaõ todos h[~u]s junto dos outros por ordem, e pello meyo da casa fica h[~u] caminho aberto pera se seruir[~e]. Naõ ha comodigo antreelles nenh[~u] Rei n[~e] justiça som[~e]te em cada aldea tem h[~u] prinçipal [~q] he como capitaõ aoqual obedeç[~e] por vontade e naõ por força, morrendo este prinçipal fica seu filho no mesmo lugar naõ serue doutra cousa se naõ dir cõ elles a gerra e conselhallos como sehaõ dauer na pelleja, mas naõ castiga seus erros n[~e] manda sobrelles cousa alguã contra sua vontade. Este prinçipal tem tres quatro molheres, a primeirat[~e] em mais conta, e faz della mais caso que das outras, Isto tem por estado e por honrra. Naõ adoraõ em cousa alguã n[~e] tem pera sy que ha na outra vida gloria pera os bõs, e pena pera os maos, tudo cuidaõ que se acaba nesta e que as almas feneçem com os corpos, e assi viuem bestialm[~e]te sem ter conta n[~e] pezo, n[~e] medida. Estes indios saõ mui bellicosos e tem sempre grandes gerras h[~u]s contra os outros nunca se acha nelles paz n[~e] he possiuel auer antrelles amizade porque huãs nasço[~e]s pellejaõ contra outras e mataõse muitos delles, e assy vai creçendo o odio cada vez mais e ficaõ imigos verdadeiros perpetuamente. As armas com que pellejaõ saõ arcos e frechas a cousa que apontar[~e] naõ na erraõ, saõ mui çertos com esta arma e mui temidos nagerra, andaõ sempre nella exerçitados. e saõ mui inclinados apellejar e muy vallentes e esforçados contra seus aduersarios, e assy pareçe cousa estranha ver dous tres mil hom[~e]s nus d[~u]a parte e doutra cõ grandes assubios e gritta frechando h[~u]s aos outros, e enquanto dura esta pelleja n[~u]ca estaõ com os corpos quedos meneãdose duã parte pera outra com muita ligeireza pera que naõ possaõ apontar n[~e] fazer tiro em pessoa certa alguãs velhas custumaõ apanharlhes as frechas pello chaõ e seruillos emquanto pellejaõ. Gente he esta mui atreuida e que teme muito pouco amorte, e quando vaõ agerra sempre lhes pareçe que tem çerta a Victoria e que nenh[~u] de sua companhia ha de morrer, e quãdo partem dizem vamos matar sem mais consideraçaõ e naõ cuidaõ que taõbem podem ser vençidos. Naõ daõ vida anenh[~u] catiuo todos mataõ e com[~e], emfim que suas gerras saõ mui perigosas, e deu[~e] se ter em muita conta por que huã das cousas que desbaratou muitos portugeses foi a pouca estima em [~q] tinhaõ agerra dos indios e o pouco caso que faziaõ delles e assy morreraõ m^{tos} miserauelmente por naõ se aperçeber[~e] como comuinha, destes ouue muitas mortes desestradas: E isto aconteçe cada paço nestas partes. Quando estes indios tomaõ alg[~u]s contrarios sellogo comaquelle impito os naõ mataõ leuaõ nos viuos pera suas aldeas (ou seiaõ portugeses ou quaisquer outros indios seus imigos) E tanto que chegaõ a suas casas lançaõ h[~u]a corda muj grossa ao pescoço do catiuo pera que naõ possa fogir, e armaõ lhe huã Rede em que durma e daõ lhe h[~u]a india moça a mais fermosa e honrrada que ha naldea pera [~q] durma com elle, e tambem tenha cuidado de o guardar, e naõ vay pera parte que naõ no acompanhe. Esta india tem cargo de lhe dar muito bem de comer e beber, e de pois de oter[~e] desta maneira sinco ou seis meses ou o tempo que quer[~e] determinaõ de o matar, e fazem grandes serimonias e festas aquelles dias e aparelhaõ muitos vinhos pera se embebedarem e fazemnos da Raiz duã herua [~q] se chama aipim, aqual feru[~e] primeiro e depois de cozida mastigaõ na h[~u]as moças virgens, e esprememna n[~u]s potes grãdes e dalli atres ou quatro dias o bebem. E o dia que haõ matar este catiuo pella manhaã se alguã Ribeira está junto daldea leuaõ no abanhar nella comgrãdes cantares e follias, etanto [~q] chegam com elle a aldea, attam no pella cinta com quatro cordas cada h[~u]a pera sua parte e tres quatro indios pegados em cada ponta destas e assi o leuaõ ao meyo d[~u] terreiro e tiraõ tanto por estas cordas que naõ se possa bollir pera h[~u]a parte n[~e] pera outra, as maõs lhe deixaõ soltas porque folgam de o ver deffender com ellas. Aquelle que o ha de matar empena se primeiro com penas de papagayo de muitas coores portodo corpo: ha de ser este matador o mais vallente da terra e o mais honrado. Traz na maõ huã espada d[~u] pao mui duro e pezado com que custumaõ de matar, e chegase ao padeç[~e]te diz[~e]do lhe muitas cousas e ameaçandolhe sua geraçaõ que o mesmo ha de fazer a seus parentes, e de pois de oter afrontado com muitas pallauras injuriosas dalhe huã grãm pancada na cabeça e logo da primeira o mata e lha faz[~e] pedaços. Está huã india velha cõ h[~u] cabaço na maõ. E assi como elle cae a code muito de pressa com elle a meterlho na cabeça pera tomar os meollos eo sange: tudo emfim cozem eassaõ e naõ fica delle cousaque naõ comaõ. Isto he mais por vingança e por odio que por se fartar[~e]. De poisque com[~e] a carne destes contrarios ficam nos odios confirmados, e sentem muito esta injuria, e por isso andaõ sempre a vingarse h[~u]s contra os outros. E se amoça que dormia com o catiuo fica prenhe aquella criança que par[~e] de pois de criada, mataõ na e com[~e] na e dizem que aquella menina ou menino era seu contrario verdadeiro, e porisso estimaõ muito comerlhe a carne e vingar se delle. E porque a ma[~y] sabe o fim que haõ de dar aesta criança, muitas vezes quando se sente prenhe mataa dentro da barriga, e faz conque moua. E aconteçe alguãs vezes affeiçoar se tanto aeste catiuo e tomar lhe tanto amor que foge com elle pera sua terra pello liurar da morte. E assy alg[~u]s portugeses ha que desta maneira escaparaõ e estaõ oje [~e] dia viuos, e muitos indios que do mesmo modo se saluaraõ, ainda que saõ alg[~u]s taõ brutos que naõ querem fogir depois de os terem presos: porque ouue alg[~u] que estaua ja no terrejro atado pera padeçer e dauaõ lhe a vida e naõ quis senaõ que o matassem, dizendo que seus parentes o naõ teriaõ por Vallente e que todos correriaõ com elle e daqui vem naõ estimar[~e] a morte, e quando chega a quella ora naõ na terem em conta n[~e] mostrar[~e] nenhuã tristeza naquelle passo. Finalmente [~q] saõ estes indios mui deshumanos e crueis, naõ se mou[~e] a nenhuã piedade: viuem como brutos animais s[~e] ordem n[~e] conçerto de hom[~e]s saõ muidesonestos e dados a sensuallidade e entregãse aos viços como se nelles naõ ouuera Rezaõ de humanos, ainda que todauia sempre tem Resquardo os machos eas femeas em seu ajuntamento e mostrã ter nisto alg[~u]a vergonha. Todos com[~e] carne humana e tem na pella milhor iguoaria de quantas pode auer: naõ de seus amigos com quem elles tem paz se naõ dos contrarios. Tem esta callidade estes indios que de qualquer cousa que comaõ por pequena que seja haõ de conuidar com ella quanta esteuer[~e] presentes, só esta proximidade se acha antrelles. Com[~e] dequantos bichos secriaõ na terra, outro nenh[~u] engeitaõ por pessonhento que seja somente aranha. Tem estes indios machos por custume arrãcarem toda barba e naõ consent[~e] nenh[~u] cabello em parte alguã de seu corpo, saluo na cabeça ainda que orredor della por baixo tudo arrancaõ. As femeas prezaõ se muito de seus cabellos e trazem nos muito compridos e penteados e as mais dellas emnastrados. Os machos custumaõ trazer[~e] o beiço furado e huã pedra no buraco metida por gallantaria outros ha que trazem o Rosto todo cheo de buracos e assy pareç[~e] mui feos e disformes: isto lhes fazem quando saõ meninos. Tambem alg[~u]s indios andaõ pintados portodo corpo, pello qual faz[~e] h[~u]s Riscos de muitas maneiras e po[~e]lhes huã çerta tinta e ficam sempre os mesmos Riscos escritos na carne: isto naõ traz se naõ qu[~e] tem feito alguã valentia. E assi tambem machos como femeas custumaõ atingirse cõ o sumo duã fruita que se chama genipapo que he verde quando se piza e depois que opo[~e] no corpo e se inxuga fica mui negro e por muito que se laue não se tira se naõ aos noue dias, isto tudo faz[~e] por gallantaria. Estas indias guardaõ castidade a seus maridos e saõ muito suas amigas porque tambem elles sofrem mal adulterios. Casaõ os mais delles com suas sobrinhas filhas de seus irmãos ou irmãas, estas saõ suas molheres verdadeiras e naõ lhas podem negar seus pais. Alg[~u]as indias se achã nestas partes [~q] jurão e prometem castidade, e assy naõ casaõ n[~e] conheç[~e] hom[~e] algum de nenhuã callidade, n[~e] no consentiraõ ainda que por isso as matem. Estas deixaõ todo o exerçiçio de molheres e immittaõ os hom[~e]s e segem seus offiçios como senaõ fossem molheres, e cortaõ seus cabellos da mesma maneira que os machos trazem e vaõ agerra com seu arco e frechas, e acaça: enfim que andaõ sempre na companhia dos hom[~e]s, e cada h[~u]a tem molher que a serue e que lhe faz de comer como se foss[~e] casados. Estes indios viuem mui descansados, naõ tem cuidado de cousa alguã se naõ de comer e beber e matar gente e porisso saõ mui gordos em estremo. E assy tambem com quer desgosto amagreç[~e] muito, e como se agastaõ de qualquer cousa com[~e] terra e desta maneira morr[~e] muitos delles bestialmente. Todos seg[~e] muito o conselho das velhas tudo a que ellas lhe dizem fazem e t[~e] no por mui çerto, da qui vem a muitos moradores naõ comprar[~e] nenh[~u]as por lhes naõ fazer[~e] fogir seus escrauos. Quando estas indias parem a primeira cousa que fazem de pois do parto lauaõ se todas n[~u] Ribeiro e ficam tambem despostas como senaõ pariraõ, em lugar dellas se deitaõ seus maridos nas Redes e assy os vesitaõ e curaõ como se elles fossem as paridas. Quando alg[~u] destes indios morre custumaõ enterrallo n[~u]a coua assentado sobre os pees com sua Rede as costas em que elle dormia, e logo pellos primeiros dias poem lhe de comer em cima da coua. Outras muitas bestiallidades vsaõ estes indios que aqui naõ escreuo porque minha tençaõ foi naõ ser comprido, e passar por tudo isto com breuidade. Dos Resgates. Estes indios naõ possu[~e] nenhuã fazenda, n[~e] procuraõ acquerilla como os outros hom[~e]s, somente cobiçaõ muito alguãs cousas que vaõ deste Reino-s-camisas, pellotes, ferram[~e]tas e outras cousas que elles tem em muita estima e desejaõ muito alcãçar dos portugeses. Atroco disto se v[~e]diaõ h[~u]s aos outros, eos portugeses Resgatauaõ m^{tos} delles e salteauaõ quantos queriaõ sem ningem lhes ir amaõ, mas ja gora naõ ha isto na terra n[~e] Resgates como soya, porque de pois que os padres da companhia vieraõ aestas partes proueraõ neste negoçio e vedaraõ muitos saltos que faziaõ os portugeses por esta costa os quais emcarregauaõ muito suas consçiençias com catiuar[~e] muitos indios cõtra direito e mouer[~e] lhes gerras injustas. E porisso ordenaraõ os padres e fezerã com os capita[~e]s daterra que naõ ouuesse mais resgates n[~e] consentiss[~e] que fosse nenh[~u] portuges a suas aldeas sem liçença do mesmo capitaõ. E quantos escrauos agora vem nouamente do sertaõ oudas outras capitanias todos leuão primeiro a Alfandega e alli os examinaõ e lhes fazem preguntas qu[~e] os vendeo, ou como forão Resgatados, porque ningem os pode vender se não seus pais ou aquelles que em justa gerra os catiuão. E os que achaõ mal acqueridos poem nos em sua liberdade, e desta maneira quantos indios se compraõ saõ bem Resgatados e os moradores da terra naõ deixaõ porisso dir m^{to} auante com suas fazendas. Cap. 8.^o dos bichos da terra. Naõ me pareçeo cousa fora de preposito tratar tambem neste summario dalg[~u]s bichos que nestas partes se criaõ pois tudo ha na mesma terra, dado que daqui se não comprehenda mais que a differença e a variadade das criaturas que ha duãs terras pera outras. Ha nestas partes muitos bichos mui feros e pessonhentos, prinçipalmente cobras de muitas castas e de nomes diuersos. Huãs ha tamgrandes e tam disformes que engolem h[~u] veado todo inteiro, e affirmão que tem esta cobra tal callidade que de pois de oter comido arrebenta pella barriga e apodreçe quanta carne tem pello corpo e fica som[~e]te no espinhaço com a cabeça e a ponta do Rabo saã, e tanto que desta maneira fica torna pouco a pouco a criar carne noua ate que se cobre outra vez da mesma carne taõ perfectamente como dantes, Isto viraõ e exprem[~e]taraõ m^{tos} indios e moradores da terra. aesta chamão pella lingoa dos indios Giboiossú. Outras ha muito maiores e mais possonhentas doutra casta differente. Saõ tamgrandes en tanto estremo que apenas desaseis indios podiaõ leuar huã que matarão junto da costa antre os Portugeses aesta cobra chamaõ Surucucù. Outra geração ha dellas que lhe chamaõ boiteninga, tem na ponta do Rabo huã cousa que soa propriamenta, como cascauel e por onde esta cobra vai sempre anda Rogindo. he huã das feras bichas que ha na terra. Outras ha que lhe chamão hebijaras. tem duas bocas huã na cabeça outra no rabo mordem com ambas, esta cobra he branca e mui curta, o mais do tempo esta debaixo da terra, he pessonhentissima sobre todas, quem desta formordido não tera vida muitas oras, e assy qualquer destas outras que morder alguã pessoa o mais quedura saõ vinte equatro oras. Ha outra callidade dellas que naõ tem dentes n[~e] mordem. Estas naõ saõ pessonhentas n[~e] tam pouco muito grandes chamão lhe Japaranas. Tamb[~e] affirmão alg[~u]s hom[~e]s que virão serp[~e]tes nesta terra com azas mui grandes E espantosas, mas achaõ se Raram[~e]te. Ha muitos lagartos e grandes pellos Rios dagoa doçe e pellos matos cuios testicollos cheiraõ milhor que almisere, E aqualquer Roupa que os chegão fica ocheiro pegado por muitos dias. Os bichos mais feros e mais danosos [~q] ha na terra saõ tigres, estes animais saõ delles tamanhos como bezerros, vaõ se aos currais do gado dos moradores e mataõ muito delle e saõ taõ feros e forçosos que huã mão que lançaõ a huã vitella ou nouilho lhe fazem botar osmeollos fora e leuão no arrasto pera omato. Tambem pella terra dentro mataõ e com[~e] alg[~u]s indios quãdo se achaõ famintos. Sobem pellas aruores como gatos, e dalli espreitaõ acaça que por baixo passa e Remetem de salto aella e destamaneira naõ lhes escapa nada alg[~u]s destes animais mataõ enfojos os moradores da terra. Toda esta terra do Brasil he cuberta de formigas pequenas e grandes, estas faz[~e] alg[~u] dano as parreiras dos moradores e as larangeiras que tem nos quintaes, e se naõ foraõ estas formigas ouuera poruentura muitas vinhas no brasil ainda que la saõ pouco neçessarias por[~q] deste Reino vai tanto vinho que sempre aterra delle está prouida. Tambem ha muita infinidade de mosquitos prinçipalmente ao longo dalg[~u] Rio antre huãs aruores que se chamaõ manges naõ pode nenhuã pessoa esperallos, e pello mato quando naõ ha viraçaõ saõ mui sobejos e perseg[~e] muito a gente. Tambem ha huã geraçaõ de Ratos que traz[~e] os filhinhos pendurados na barriga e alli se criaõ e andaõ assy pegados ate ser[~e] grãdes. Bogios ha muitos e de muitas castas como ja se sabe: tanto que as femeas parem pegaõ se os filhos nas suas costas e sempre andaõ caualgados nas mãis ate ser[~e] bem criados e posto que as persigaõ e as matem naõ sequer[~e] desapegar dellas. Ha tambem muitos lobos marinhos e porcos marinhos que se criaõ no mar e na terra. Outros muitos bichos ha nestas partes pella terra dentro que sera impossiuel poder[~e] se conheçer n[~e] escreuer tanta multidaõ por[~q] assy como a terra he grandissima, assy saõ muitas as callidades e efeições das criaturas que Deos nella criou. Cap. 9.^o da terra [~q] certos hom[~e]s da Capitania de porto seguro forão a descobrir, e do [~q] acharão nella. Posto que minha tençaõ naõ era tratar neste summario senaõ das cousas que saõ gerais portoda costa do Brasil, de que os moradores da terra parteçipaõ, pareçeo me tambem neçessario e conueniente aos louuores da terra denunçiar neste Capitullo a Riqueza dos metais [~q] affirmaõ auer por ella dentro prouãdo tudo isto com pessoas [~q] o acharão, virão, e experem[~e]tarão: e amaneira como se descobrio foi esta [~q] se sege. A esta Capitania de porto seguro chegarão certos indios do sertão a dar nouas d[~u]as pedras verdes que auia n[~u]a serra muitas legoas pella terra dentro, e traziaõ alguãs dellas por amostra, as quais erão esmeraldas mas não de muito preço. E os mesmos indios dezião [~q] daquellas auia muitas, e que esta serra era muj fermosa e Resplandeçente. Tanto [~q] os moradores desta Capitania disto forão certificados fezeraõ se prestes sinco[~e]ta ou sesenta portugeses com alg[~u]s indios da terra e partirão pello sertão dentro com determinção de chegar aesta serra onde estas pedras estauaõ. Hia por capitão desta gente h[~u] martim carualho que agora he morador da Bahia de todollos sanctos, Entrarão pella terra alguãs dozentas e vinte legoas, onde as mais das serras [~q] acharão e virão erão de mui fino christal e toda terra [~e] si mui fragosa, E outras muitas serras de h[~u]a tarra azullada, nas quais affirmão auer muito ouro porque indo elles por antre duas serras destamaneira forão dar n[~u] Ribeiro que pello pee d[~u]a dellas deçia noqual acharão antre area h[~u]s grãos meudos amarellos, osquais alg[~u]s hom[~e]s apalparaõ com os dentes e acharão nos brãdos mas naõ se desfazião, finalmente que todos assentaraõ ser aquillo ouro n[~e] podia ser outro metal pois omesmo ouro desta maneira nasçe nas partes onde o ha. Apanharão destes graõs antre area do Ribeiro quantidade dum punhodo os quais acharaõ muito pezados que tambem era proua de ser ouro; disto naõ fezerão mais experiençia por ser aquillo no deserto e auer muitos dias [~q] padeçiaõ grãde fome nem comião outra cousa senaõ semente deruas e alg[~u]a cobra que matauão. passarão adiante determinando avinda tornar por alli a perçebidos de mantim^{tos} pera buscar[~e] a serra mais devagar donde aquelle ouro deçia ao Ribeiro. acharaõ pellos matos muita canafistola, e por este caminho acharão outros m^{tos} metais que naõ conheceraõ, n[~e] podiam esperar pellas gerras dos indios que se alleuantauaõ contraelles. Alg[~u]s indios lhes deraõ noticia segundo a mençaõ que fazião [~q] podiam estar cem legoas da serra das pedras verdes que hiaõ buscar e que não auia muito dalli ao peruú finalm[~e]te [~q] cõ os imigos que Recreçião e pella gente [~q] adoeçia tornaraõ se outra vez em almadias por h[~u] Rio que se chama Cricaré, onde se perdeo n[~u]a cachoeira a canoa emque vinhaõ os grãos douro [~q] traziaõ pera mostra. Nesta viag[~e] gastarão oito mezes e assi desbaratados chegarão aesta Capitania de porto seguro. Os que deste perigo escaparaõ affirmão auer naquellas partes muito ouro seg[~u]do asmostras e os Signais que acharão: e se la tornar gente aperçebida como cõuem contoda prouisaõ neçessaria, e leuarem pessoas que disto conheçaõ diz[~e] que se descobrirão nesta terra grandes minas. Quisera esereuer mais meudamente das particullaridades desta prouinçia do brasil, mas porque satisfezesse atodos com breuidade guardeime de ser comprido posto [~q] os louuores da terra pedissem outro liuro mais copioso E de maior vollume onde se comprehendess[~e] por extenço as exçellencias e diuersidades das cousas [~q] ha nella pera Remedio e porueito dos hom[~e]s que la for[~e] viuer. E por que a felliçidade e augm[~e]to desta prouinçia consiste em ser pouoada de muita g[~e]te, naõ auia dauer pessoa pobre nestes Reinos [~q] naõ fossem viuer aestas partes com fauor de .S.A. onde os hom[~e]s viu[~e] todos abastados e fora das neçessidades que cá padeçem. E desta maneira permittira Deos que floreça tanto a terra desta noua lusitania que com ella se augmente muito a coroa destes Reinos e seia dos outros enuejada pera que não desejemos terras estranhas prometendo esta nossa tanta Riqueza e prosperidade aos [~q] afor[~e] buscar pera seu Remedio. Fin. --- Provided by LoyalBooks.com ---